18 março 2011

Rango, 2011: uma homenagem de qualidade ao western.


- Atenção: contém spoilers -

Brincadeiras com atributos antropomorfos de certos animais já viraram rotina para muita coisa. No cinema, então, já estamos acostumados com um urso comilão, com gatos preguiçosos, e burros nada espertos. E que tal um camaleão com problema de identidade? E assim está composta a psiquê de um bom personagem.

O heroi surge na tela de maneira patética: dentro de um aquário onde interpreta um ator - outro trocadilho ótimo para um camaleão. Contracena com uma boneca, ou melhor, com o tronco e um braço de uma boneca, um "peixe de corda", um inseto morto, e com o cenário. A vida quadrada, outro trocadilho, tem a cara de Rango. As comparações, os trocadilhos, serão uma constante em todo o filme. E da patética vidinha em aquário, veremos um personagem crescer junto com a história. Como um excelente filme de "faroeste" deve ser.

Do "teatro" para as telas, a homenagem ao estilo "bang-bang" vai crescendo em Rango. Após o acidente, nos vemos em meio ao cenário de Win Wenders de "Paris, Texas, 1984" - que em minha opinião, definiria como o faoreste retornaria em tempos mais atuais.E assim, outra constante: a graça e o bom gosto vai sendo demonstrado a cada segundo enquanto o filme passa pelos cenários e situações comuns ao gênero western.

Não dá para falar da homenagem sem falar de suas referências. Do xerife "quase" honrado, da frágil dama que tem que ser durona em busca de justiça, pistoleiros de rápido gatilho, o índio rastreador (aliás, senti-me em meio à diligência que perseguiu Butch Cassidy e Sundance Kid), o "saloon", saqueadores, o impacto da chegada do forasteiro como em "Por um Punhado de Dólares, 1964" e o bigodinho de Lee Van Cleef em uma temerosa serpente mojave de arrepiar.

A homenagem não possui referências apenas do gênero. Ele brinca, por exemplo, com Jerry Lewis, reproduzindo a cena do encontro de Lewis com George Raft em "O Terror das Mulheres, 1969" quando, apavorado, vai se complicando a cada nova tentativa de limpar o rosto do bandido. Também com "Senhor dos Anéis" e "Star Wars" - que para muitos são "westerns" medieval e espacial, respectivamente. Aliás, chega a ser um marco a batalha à "Star Wars" com A Cavalgada das Valquírias, de Wagner, tocada por banjos. Aliás, falando em trilha sonora, as corujinhas fazem uma homenagem à altura de Morricone e Tiomkim que os deixariam orgulhosos.

A dramaticidade, o crescente, as quebras repentinas de continuidade, os exageros, enfim cada coisa desprende um aroma de puro western. Mas, assim como Western não é filme apenas para "vovô", a animação não é filme apenas para os netinhos. Olhar para o filme de com um ou outro preconceito será sinônimo de decepção, com toda a certeza.

Até mesmo os pontos negativos do filme são típicos de um bom "faroeste": custa entrar na história, a ação demora para aconter, enredo irritantemente simples e dependente das expressões dos personagens. Além disso, é uma brincadeira de metalinguagem cinematográfica. Ou seja, para iniciados ao gênero. Sem isso, o filme se torna entediante, pois não tem nem piadinha fácil - daquelas que sacrificam o roteiro em busca da graça que não tem.

Ósculos e amplexos!

PS* Uma curiosidade: cada resenha ou crítica que vejo sobre o filme, noto uma criatividade dos críticos quanto ao porquê do nome "Rango". Misturam "Django", "Jivago", e tantos outros nomes de forma bastante criativa mesmo! O mais interessante é que o próprio filme dá uma pista: em uma garrafa, nosso cameleão cobre parte da palavra DURANGO ... e voilá: tem-se (Du) Rango (Kid).

2 comentários:

Fah disse...

Então.. gostei mto do filme, porém tive uma visão diferente da sua. Além de tudo o que relatou me impressionou a realidade de vida que o filme mostra,ou melhor a lição que nos mostra. Mostrou o que o materialismo faz c/ as pessoas.Que pessoas de má índole se atraiçoam. Que a fé e perseverança nos leva longe. E ao meu ver o mais importante: Todos temos um "valente" dentro de nós, é só procurarmos.

Michael Genofre disse...

As mensagens que um filme passa nos tocam de maneiras muito diferentes. A estética de um filme não seria nada se não tivessemos algo pelo qual abstrairmos. E, se conseguimos extrair um algo a mais como você extraiu, melhor ainda para um bom filme. De fanfarrão, o protagonista passou a ser de fato um heroi. Moral da história?

Beijão, mana!