01 setembro 2010

"Pió que tá pode ficá"





Gaudêncio Torquato é conhecido jornalista, professor da renomada USP, consultor de comunicação bastante famoso em sua área. Mas, ao escrever seu texto “pior que está não fica”, assinou como consultor político para O Estado de São Paulo. Cometeu dois equívocos logo de início: não se trata de um texto político, tampouco em um veículo politicamente imparcial.


Qual a relação entre as mudanças históricas no pensamento político com a expansão da alienação, ou com a ridicularização da política? Para Torquato, apenas a de que nossa consideração para com a política chegou ao fundo do poço. E, para ilustrar seu argumento, utiliza-se da campanha eleitoral de Tiririca.


Para Torquato, não será espantoso se Tiririca se eleger, pois outras celebridades já conseguiram. E, defende duas hipóteses para tal movimento: “ou os novos atores foram compelidos a ingressar no espaço público para cumprir relevante missão a serviço de coletividades que representam” ou “a opção se deve ao esgotamento do ciclo profissional e ao vislumbre de uma carreira sob as luzes da democracia representativa”. Para logo após ignorar a linha investigativa iniciada para começar outra com o propósito de tentar desvendar o que significa a candidatura de celebridades.


Para buscar um significado, elabora o seguinte questionamento: “a razão para profissionais de outros nichos ingressarem no mundo da política tem que ver com a eleição de uma figura de origem humilde para o cargo mais importante da Nação?”. Para tal hipótese, Torquato concorda de início, mas considera que há outros componentes talvez mais apropriados para explicar tal fenômeno. E vai buscar na explicação psicológica de alguma teoria dos ídolos o motivo pelo qual uma celebridade consegue se eleger.


Termina seu texto parabenizando as celebridades que usam de sua fama para lutar por algum ideal ou para representar uma base política real. Parabeniza o sucesso do governo Lula. E critica a existência dos oportunistas e quadros debochados que aparecem no horário eleitoral, associando a inércia que a política possui no Brasil. E termina concordando com Tiririca quando diz que “pior que tá não fica”.


Minha vez: quanta bobagem, senhor Torquato! Pior que está pode ficar sim!


Antes de eu explicar como podem as coisas ficarem pior que estão, questionemos o que vossa sapiência insinuou em seu texto. Primeiramente, não se coloca em um mesmo saco as celebridades. Há inúmeras que vieram de uma base política real, que representam inclusive anseios de classe. Netinho de Paula, do PcdoB, apesar de não ser comunista, já socou jornalista em “pânico” por insinuações preconceituosas diante de uma noite de gala em dia de luta pela igualdade racial. Leci Brandão sempre teve atuação entre as comunidades carentes, sendo por muitas vezes sua voz. Enfim, tantos que vossa sapiência diz que aplaude, mas que de uma certa maneira, em seu texto, acabou colocando-os em um mesmo saco.


Não é de hoje que a política possui quem a ridicularize. Lembra-se do Macaco Tião, que é até hoje o animal mais votado da história? Ele foi invenção do Casseta e Planeta em 1988. E o rinoceronte Cacareco (que acho que você o mencionou an passant no fim do seu texto, mas não ficou claro) da década de 1950? Pior, Silvio Santos para Presidente? Há alguma ligação entre tais momentos históricos? Entre os candidatos? Entre a ridicularização?


Agora, preocupante é afirmar que a política é para políticos profissionais. Afirmação quase platônica, de efeito tão fascista quanto o desejado por este filósofo quando em sua A República. Principalmente para um país que finalmente começa a ter uma democracia amadurecida. E que, eleger o Tiririca, que ridiculariza a democracia, é sim surpreendente e jamais deverá ser vista com naturalidade.


Pior que está pode ficar. Podemos retroceder em nosso estágio. Ainda não temos uma democracia tão amadurecida assim, apesar de nosso melhor momento político, econômico e social da história. Podemos eleger quem acha que dois professores ganhando mal e sem o menor incentivo em uma mesma sala é a solução para os problemas educacionais. Podemos eleger Tiriricas, e institucionalizar a corrupção e a falta de compromisso para com o povo. Podemos aceitar ideias tiranas para solucionar o problema de sermos um país ainda longe de possuir o PIB que possui os Estados Unidos. Pior que está pode ficar!


Estou apenas usando meu livre exercício da crítica. Não te conheço, mas respeito seu trabalho em comunicação. Mas, francamente, quanta bobagem para quem assina ser consultor político, e para um jornal de enorme circulação (e questionáveis posicionamentos autoritários ao longo de todo o período de amadurecimento político brasileiro que tivermos nestes últimos oito anos). Pior que tá sempre há como ficar.


Ósculos e amplexos!


PS: O blog ainda está em obras... mas as eleições dão situações que temos que parar o que estamos fazendo para publicar nossa opinião.

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