Há tempos venho buscando resposta
para o debate sobre a comunicação nos movimentos sociais. Desde quando houve
uma série de debates e congressos que eu participei enquanto militante do
movimento estudantil sobre a crise do movimento secundarista. Esse debate já
passou mais de uma década e eu continuava sem uma resposta. E olha que muito
procurei. Eis que, completamente descompromissado, fuçando as prateleiras de
uma livraria encontro um livro que não me deu as respostas, mas o caminho para
a conclusão (Kevin A. Hill, John E. Hughes. “Cyberpolitics: citizen activism
in the age of the Internet” Rowman & Littlefield, 1998). Curiosamente,
o livro foi publicado em 1998, muito antes da chamada internet 2.0. E, bastante
visionário, trouxe-me o caminho para as reflexões que tentarei descrever aqui
(quem sabe, mais tarde, não vire um artigo). Utilizarei como exemplo o
movimento estudantil, mas creio que as situações podem ser aplicadas em
qualquer organização política.
Em uma conversa com amigos que
ainda atuam no meio estudantil surgiu uma dúvida: qual a importância atualmente
do jornalzinho do grêmio ou do centro acadêmico? Praticamente não se vê mais
nas mãos de ninguém um papel sequer dizendo o que o diretor, o professor, o
coordenador ou mesmo o que os estudantes fazem. Mas, por outro lado, muito mais
do que se poderia imaginar, há mais de uma década, já se encontra de tudo com
uma riqueza imensa de detalhes disponível na internet para que souber procurar.
Inclusive, sobre todos os elementos de uma vida escolar ou acadêmica. São os
efeitos da chamada ciberpolítica.
A ciberpolítica, resumidamente, é
o uso das novas tecnologias na política. Parte-se do princípio que cada nova
tecnologia que se massifica tem um grande potencial político, sendo capaz de
promover mudanças na sociedade. Porém, acreditar que uma ação na internet, por
si só, pode ser capaz de mudar o mundo soa como um exagero imenso. Afinal, por
melhor que seja uma determinada ação política no meio virtual, ela é incapaz de
mudar a forma pela qual as tomadas de decisões são realizadas. Ainda que
influencie, e muito, ela não transforma. A ciberpolítica é capaz de acelerar ou
desacelerar, por algo em evidência ou até mesmo inverter prioridades, porém ela
não altera o processo político em si.
Aquele que acredita que a
política pode ser inteiramente feita pela internet se engana e se ilude
igualmente aquele que acredita que é uma grande bobagem a chamada
ciberpolítica. Muito mais que uma técnica de comunicação, o uso da internet é
uma estratégia política complexa. O domínio dessa ferramenta consiste em, mais
ou menos, na predeterminação de um resultado. Em outras palavras, ao selecionar
quais as entradas no meio virtual se espera uma determinada saída – deixando que
a surpresa seja no sentido da intensidade, jamais na propriedade. A retroalimentação
é base da ciberpolítica. Todos os elementos devem se comunicar entre si, de
maneira coerente e constante. Eis o núcleo do processo.
Enquanto o jornalzinho da escola
agia como uma espécie de vitrine – onde as informações estão expostas para quem
quiser ver – a chamada web 2.0 é inteiramente interativa. E aquele ator
político que se pretende atuar na rede mundial de computadores deve pensar de
maneira a correlacionar todos os entes comunicativos e fazer com que interajam
entre si. Portanto, o jornalzinho da escola estará obsoleto assim como obsoleto
é o blog do grêmio. Há a necessidade, portanto, de um verdadeiro ativismo
comunicativo. Todas as ferramentas de comunicação devem interagir com todos os
que se deseja comunicar. O secretário de comunicação de um grêmio estudantil,
que no máximo cuidava da periodicidade do jornalzinho, hoje tem que ser
responsável por uma imensa estratégia de comunicação que envolva o jornalzinho,
o blog, os blogues de todos os estudantes e apoiadores do grêmio, o facebook, o
Orkut, o Twitter, o tumblr, o foursquare, SMS, e tudo o mais que for surgindo e
se massificando.
Jamais subestimar a capacidade
comunicativa de um meio de comunicação é a primeira regra. Jamais saia
utilizando os meios de comunicação sem uma estratégia de comunicação bem
definida é a segunda. Ter um discurso de comunicação é a terceira – e que tem
que ser o discurso de muitos, não o de um (empowering people).Quarta regra:
desenvolva as ferramentas comunicativas e coloque à disposição de todos e
todas, livremente e sem medo de críticas (aliás, há sempre uma forte tendência
em se querer limitar ou mesmo aplicar uma espécie de censura interna aos membros
de uma determinada organização em nome de uma suposta unidade de ação. Ledo
engano, é justamente na diversidade de ideias é que surge a unidade – as coisas
mudaram muito com a chegada da internet). E, por fim, visibilidade – online e off-line!
Por fim, há um processo que deve
ser considerado em matéria política. Todas as ações sociais, em geral, seguem
três passos: debate, convocatória e mobilização. No primeiro, define-se
problema e estratégia. No segundo, angaria apoios. No terceiro, massifica. Mas,
engana-se quem acredita que a ciberpolítica tem maior peso somente no terceiro
passo. Tem peso em todos eles, principalmente no primeiro. O debate, com a
interatividade online e off-line exigida pelos tempos atuais, exige um número
significativamente maior de pessoas para que a estratégia definida ganhe corpo
e mais tarde às ruas. Então, respondendo, não é o jornalzinho que se está em
crise, mas toda a estratégia de comunicação – que infelizmente, não há uma
cultura instituída nos movimentos sociais ainda.